Proposta aprovada por ampla maioria altera critérios de cálculo de penas e gera novo embate entre Planalto e comando do Congresso
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| KEBEC NOGUEIRA/METRÓPOLES @kebecfotografo |
O Senado Federal aprovou nesta quarta-feira (17) um projeto de lei que altera as regras de cálculo de penas para crimes contra o Estado Democrático de Direito, abrindo espaço para redução de punições e progressão mais rápida de regime. A proposta, que pode beneficiar condenados pelos atos de 8 de Janeiro e também o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), agora aguarda a análise do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já sinalizou a possibilidade de veto.
O texto foi aprovado em plenário por 48 votos favoráveis e 25 contrários, consolidando a segunda derrota do governo no mesmo dia sobre o tema. Mais cedo, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) havia dado parecer favorável ao projeto por 17 votos a 7, em uma votação marcada por divergências internas e insatisfação de aliados do Planalto.
A tramitação acelerada foi resultado de um acordo costurado pelo líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), que permitiu a votação simultânea na CCJ e no plenário. O entendimento previa, como contrapartida, a inclusão na pauta de um projeto prioritário do Executivo que trata do corte de benefícios fiscais, essencial para o equilíbrio das contas públicas em 2026. O acordo, no entanto, foi fechado sem consulta prévia à base governista nem ao Palácio do Planalto, o que gerou críticas e desgaste político.
Lideranças de partidos como MDB e PSD reagiram negativamente à articulação e chegaram a se retirar da votação na CCJ. O senador Renan Calheiros (MDB-AL) classificou o acordo como uma “encenação”, enquanto o presidente da comissão, Otto Alencar (PSD-BA), reclamou publicamente da ausência de representantes do governo durante a sessão.
Diante da repercussão, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, afirmou que o Executivo não chancelou qualquer negociação envolvendo a proposta. Segundo ela, o texto aprovado extrapola os atos de 8 de Janeiro e pode atingir condenados por outros crimes. “Quem atentou contra a democracia precisa responder por seus atos”, declarou.
Apesar das tentativas do governo de devolver o projeto à Câmara dos Deputados, o relator no Senado, Espiridião Amin (PP-SC), defendeu que a alteração feita — a partir de emenda do senador Sérgio Moro (União Brasil-PR) — foi apenas de redação. A mudança limita explicitamente a aplicação da nova dosimetria a crimes relacionados aos atos de 8 de Janeiro, afastando a possibilidade de alcance mais amplo. A interpretação foi mantida pela maioria, permitindo que o texto siga diretamente para sanção presidencial.
Força política e tensão institucional
A votação foi interpretada nos bastidores como uma demonstração de poder do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que desde o início defendeu a revisão da legislação penal aplicada a crimes contra as instituições democráticas. Alcolumbre se comprometeu publicamente com a aprovação da matéria e conduziu uma tramitação rápida, apesar da resistência inicial do governo.
O episódio também expôs o clima de tensão entre o Senado e o Planalto, agravado após Lula optar por indicar o advogado-geral da União, Jorge Messias, ao Supremo Tribunal Federal, em vez de apoiar o nome do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), preferência de Alcolumbre.
Principais pontos do projeto
O texto aprovado é um substitutivo ao PL nº 2.162/2023 e estabelece que, quando houver condenação por mais de um crime contra o Estado Democrático de Direito, prevalecerá apenas a pena mais grave, sem soma automática das punições. Também prevê redução de até dois terços da pena para crimes cometidos em contexto de multidão, desde que o condenado não tenha atuado como líder ou financiador.
Além disso, a proposta assegura progressão de regime após o cumprimento de um sexto da pena, inclusive para reincidentes. De acordo com estimativas feitas durante a tramitação na Câmara, as novas regras poderiam reduzir significativamente o tempo de prisão de alguns condenados — incluindo Jair Bolsonaro, cuja pena atual ultrapassa 27 anos.
Com a aprovação no Senado, a decisão final agora cabe ao presidente da República, que poderá sancionar ou vetar total ou parcialmente o texto, reacendendo o debate sobre os limites entre revisão penal e responsabilização por ataques à democracia.
Da redação Estrutural On-line

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